A Fonte da Juventude: uma aventura que já nasce datada

É um tanto deprimente ver tanto talento desperdiçado com gosto – e com orçamento. A Fonte da Juventude, disponível na Apple TV, tinha tudo para ser uma aventura empolgante, daquelas que fazem a gente embarcar num avião imaginário rumo ao desconhecido, mas o que entregaram foi uma versão diluída de A Lenda do Tesouro Perdido (que, sejamos sinceros, já era uma paródia desbotada de Indiana Jones). O resultado é um filme que não erra por falta de dinheiro ou de elenco, mas por pura falta de vontade.

A direção ficou nas mãos de Guy Ritchie, que aqui parece ter sido tragado por uma fórmula pasteurizada, como se estivesse dirigindo sob contrato com uma IA corporativa. Cadê o estilo enérgico, os cortes secos, os diálogos afiados e a identidade visual que marcaram sua carreira em Snatch, Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes, Sherlock Holmes ou até mesmo o live action do Alladin? Tudo isso foi substituído por um piloto automático sonolento, desses que transformam até a cena mais promissora em um powerpoint caríssimo.

O elenco também é de respeito – pelo menos no papel. John Krasinski, de The Office e Um Lugar Silencioso vive aqui um explorador genérico contratado por um bilionário (interpretado por um Domhnall Gleeson praticamente irreconhecível de tão apagado e com um segredo tão óbvio que dá até preguiça) para encontrar a mítica fonte da juventude. É o tipo de papel que pede carisma, coragem, alguma vulnerabilidade – mas Krasinski parece mais interessado em arrecadar fundos para seus próximos projetos autorais do que em dar vida ao personagem.

Natalie Portman, vencedora do Oscar e um dos nomes mais respeitados de sua geração, também está em modo contas a pagar. Ela vive a irmã moralista, aquela voz da consciência que aparece para lembrar que “quem mente rouba, quem rouba mata”, tal e qual Raquel Aciolly de Vale Tudo. A personagem é tão previsível que poderia ser substituída por uma placa de trânsito. E como todo clichê de aventura genérica exige, temos também o garotinho gênio – uma mistura de A Múmia 2 com qualquer filme da Sessão da Tarde nos anos 2000 -, que sabe mais que todos os adultos reunidos, e ainda por cima resolve tudo com frases prontas e habilidades que desafiam a lógica.

Mas talvez o ponto mais frustrante seja a falta de envolvimento dos próprios personagens com a história. Em plena Pirâmide de Gizé, após o que seria um dos maiores achados arqueológicos da história da humanidade, os protagonistas simplesmente… seguem em frente. Nada de comoção, de reverência, de impacto. Pior: eles reencontram a equipe que ficou para trás e sequer se dão ao trabalho de contar o que rolou. É como se tivessem tropeçado numa pedra no caminho, e não descoberto um segredo milenar. A sensação de vazio se estende até às cenas de ação, montadas com tamanha assepsia que parece que o filme foi editado por um algoritmo com pavor de sangue, suor e emoção.

E o final? Simplesmente é o final de Indiana Jones e a Última Cruzada. Sem ironia. Sem reinvenção. Sem vergonha. O filme copia até a resolução – aquela mesma, envolvendo escolhas, sacrifícios e quase um cálice misterioso. A diferença? Zero impacto. A trilha sonora? Horrenda, para dizer o mínimo.

No fim das contas, A Fonte da Juventude representa mais uma tentativa do cinema de reviver a magia do gênero de aventura e caça ao tesouro – aquele que, desde Indiana Jones, vive tentando se reinventar sem sucesso. Filmes como esse prometem emoção, enigmas e lugares exóticos, mas entregam um roteiro genérico, personagens rasos e uma sensação incômoda de déjà vu. O gênero ainda tem potencial, mas só quando é tratado com a mesma paixão e personalidade que o consagraram no ado.


A FONTE DA JUVENTUDE

  • Direção: Guy Ritchie
  • Elenco: John Krasinski, Natalie Portman, Domhnall Gleeson
  • Gênero: Aventura / Ação / Caça ao Tesouro
  • Duração: 127 minutos
  • Classificação indicativa: 14 anos

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